sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

ENSAIO COMENTADO PELA ADVOGADA E ESCRITORA JAMILA MAFRA SOBRE A OBRA A DESOBEDIÊNCIA CIVIL, DO FILÓSOFO HENRY DAVID THOREAU


ENSAIO COMENTADO POR JAMILA MAFRA SOBRE A OBRA A DESOBEDIÊNCIA CIVIL, DO FILÓSOFO HENRY DAVID THOREAU 
 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ   

              A imposição do costume e da ausência de suficiência autonômica gera a necessidade da existência de um governo superior e hierárquico nas civilizações modernas, assim como nas antigas. Seja esse governo por eleição ou por herança monárquica, ou qualquer outro sistema de escolha, a construção de um Estado responsável por seus habitantes se torna inevitável para a satisfação geral.
             A incapacidade dos seres humanos de governarem a si mesmos através da inteligência e bom senso se torna evidente a partir deste momento em que as sociedades se apresentam cada vez mais em desordens de todo tipo, sobrecarregando o poder judiciário de processos que trazem a promessa de resolverem seus problemas e maus negócios, e também o poder público a quem procuram para resolver seus problemas de desemprego, falta de saúde, moradia, entre outros. Boa parte da culpa por tal incapacidade das populações é do próprio Estado que promete a sociedade em suas leis milhares de direitos e benefícios que quase nunca consegue cumprir mesmo arrecadando bilhões em dinheiro através da cobrança de impostos e tributos. A Anarquia propõe que cada um governe a si mesmo, não sendo necessário, portanto, que exista um sistema complexo de leis e governantes que controlem a sociedade.
         O ideal seria que o Estado interferisse o mínimo necessário na sociedade, mas o totalmente inverso é o ocorre, percebe-se que a interferência do Estado é cada vez mais forte em todos os âmbitos da vida civil e particular das pessoas. Tal situação gera inevitavelmente uma condição de servidão por parte da população que continuará dependente de governantes que lhes ditem as regras.
            Tal incapacidade de se autogovernar acarreta para a população uma perda parcial de sua liberdade, pois se torna totalmente submissa às vontades e ideias de um governo que nem sempre é justo, de um governo que dita suas leis financeiras como bem entende sem levar em consideração a realidade social. É por este motivo que surgem os governos ditadores e totalitaristas, à medida que a população recua e se submete os maiorais com ânsia de poder e status conseguem chegar aos mais altos cargos de governos e então assumem o controle das nações estabelecendo suas leis, regras e padrões absolutistas. Assim, os ciclos históricos das formas de governo se tornam um círculo vicioso, que oscila entre períodos de ditaduras cruéis e democracias falidas, como ocorreu no Brasil.    
                  Em uma democracia os legisladores são, ou pelo menos deveriam ser, representantes do povo, mas de um modo geral não representam ninguém, a não são ser seus próprios ideais, uma vez que o povo que o elegeu não toma nenhuma decisão conjunta como por exemplo uma lei é decidida ou aprovada.
                 Embora bem intencionada, a própria população que muitas vezes maldiz as injustiças cometidas pela má administração do Estado é a responsável por sustentar e manter o governo deste Estado como se encontra. As classes empresariais e comerciais brasileiras, por exemplo, que são umas das maiores vítimas da elevada carga tributária, são as classes que mantêm a injustiça e assistem de cabeça baixa a expansão da ditadura financeira que as submetem. A manifestação oral de indignação e descontentamento por uma injustiça não surte efeitos, a ação e atitudes eficazes daqueles que reconhecem o erro é necessária para que alguma mude ou melhore. A população injustiçada que é a maioria é fraca, e a minoria que são os legisladores e demais governantes corruptos e desinteressados pelos assuntos do povo são fortes. Se ao menos um habitante tivesse a coragem de fazer diferente, e agir de acordo com o que sabe ser justo, independentemente do que diz a lei, a própria lei seria modificada, assim disse Thoreau “Pois não importa quão limitado possa parecer o começo: Aquilo que é bem feito uma vez está feito para sempre!”
                 Se todas as pessoas se unissem em comum acordo para não fazer ou não cumprir determinada obrigação imposta pelo Estado, como por exemplo, neste mês mais da metade da população não pagar os impostos, como forma de protesto, os efeitos positivos surtidos seriam mais imediatos e eficazes, ou ainda, se como protesto contra a corrupção no Brasil ninguém comparecesse às urnas pra votar a revolta e indignação por causa das injustiças dariam suas trágicas conseqüências aos governantes que não se elegeriam por falta de votos.

              O dinheiro pode desvirtuar a mente humana conforme é adquirido, pois depois de consegui-lo o único propósito lógico que surge é o de saber como gastá-lo. O ideal quando se tem dinheiro é colocar em prática os planos que se tinha quando ainda se era pobre.
            Às pessoas ricas interessa basicamente manter a condição atual do Estado que a tornou rica, praticamente uma troca de favores útil para ambos, pois um precisa permanecer no poder, e o outro precisa manter seu padrão elevado de estilo de vida e suas riquezas. Neste caso dois Estados camuflados em um só se apresentam: o Estado dos privilegiados, e o Estado dos desfavorecidos.
            De certa maneira o confisco de bens por falta de pagamento dos impostos é injusto, pois tira o direito de enriquecer do ser humano, ao perder seus bens por deixar de ter pagado um imposto exigido pelo Estado que mal lhe dá segurança, o ser humano tem sua dignidade ferida, pois o “ocioso não comerá o pão e nem vestirá as vestes do trabalhador”, a população trabalha para sustentar um governo e governantes ociosos, que muito arrecadam e pouco fazem para retornar à sociedade o que ela lhe pagou obrigatoriamente. E fazem ainda parte desse governo ocioso não somente os legisladores e membros do poder executivo, mas também uma grande parte dos funcionários públicos que administram muito mal as máquinas públicas, além de também participarem dos atos de corrupção.
           Nenhum ser humano deveria ser sujeitado às duras penas da obrigação de pagar impostos sem um efetivo retorno social por parte do governo que o arrecada, ou ainda,  não seria necessário a existência de impostos se ao invés de sermos obrigados a pagar uma quantia em dinheiro ao Estado continuássemos com esse dinheiro para que nós mesmos pagássemos nossas despesas educacionais e sociais, assim o Estado não precisaria tomar sobre si a responsabilidade de educar e curar seus cidadãos, pois os mesmos fariam isso por si. Um Estado onde todos os serviços fossem particulares e privados seria muito mais prático e funcional do que aquele em que os serviços de saúde e educação são fornecidos pelo Estado que os mantém com o dinheiro arrecadado nos impostos e tributos. Aliás, os serviços públicos no Brasil são muito mal mantidos e mal gerenciados, acarretando em enormes gastos públicos por um serviço de baixa qualidade. Os impostos deveriam ser eliminados e os serviços públicos privatizados, assim cada cidadão seria livre para usar dinheiro e pagar pelos serviços que precisa. Os serviços prestados por instituições particulares são sempre de melhor qualidade que do que os serviços prestados pelo governo. Um único imposto já seria suficiente para manter as despesas básicas do governo quando todos os serviços públicos básicos fossem privatizados e todos os outros impostos extintos. Deste modo seria construída uma nova sociedade, uma nova civilização onde cada cidadão seria capaz de governar a si mesmo nas questões sociais mais básicas.
              Para um Estado ser realmente livre e democrático o governo deve priorizar o indivíduo como a fonte primordial de seu poder, e deve ainda tratar o indivíduo com toda dignidade que esse por ser fonte de poder do Estado merece ser tratado. No entanto atualmente, tanto no Brasil como em outros países, os cidadãos são tratados como subordinados do Estado, para o qual mendigam constantemente nas filas dos hospitais seu direito a remédios, a uma cirurgia, a um atendimento. Os cidadãos são um amontoado de subordinados do Estado que mendiga a este seu direito de frequentar uma escola, uma universidade, dentro de um aglomerado de sistemas burocráticos de comprovações e atestados de pobreza e carência.
                  Como pode ser justo os governantes brasileiros, ou de qualquer outro lugar, viverem em casas luxuosas, ganharem altos salários, terem várias regalias enquanto o povo que eles representam vive em condições precárias sobrecarregados de impostos a pagar, sendo massacrados pela ignorância e dependência deste Estado administrativamente pobre? Se os legisladores brasileiros e líderes do poder executivo são representantes do povo então que viva igual ao seu povo, nas mesmas condições de salário e moradia, ou então que o povo viva igual a eles que o representam. Um reino que volta contra si mesmo não pode subsistir, e é isso que ocorre na sociedade, o povo e seus governantes estão presos a jugos desiguais, uma nação assim não pode permanecer em paz até o fim de um século sem que um enorme terremoto de revoluções aconteça.

JM JAMILA MAFRA              


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